Vou contar dois “causos” como dizemos nós, os mineiros, de brasileiros que estão ou estavam tentando fazer umas economias para voltar (ou não) ao Brasil.

O primeiro causo, menos triste, ainda assim, de muita carga emocional e ansiedade, é o do meu cliente de traduções juramentadas (nos tornamos amigos ao longo de sua dolorosa trajetória) que obteve cidadania italiana, mas não conseguiu se estabelecer no país de suas origens. Vindo do interior de Minas Gerais, com excelência em sua especialidade, formado e doutorado em boas universidades brasileiras, autor de livros publicados, embora sem retorno financeiro, acabou parando na Inglaterra, onde sua sorte não foi maior: está sobrevivendo de faxina. No entanto, depois de anos de luta, há uma luz no final do túnel: pode ter seu diploma reconhecido por um órgão britânico ligado à saúde. O fantasma do Brexit o circunda e, dentro de alguns dias, vai receber seu veredicto.  Se positivo, poderá começar a sua outra batalha que é procurar uma posição profissional na Europa.  Se for negado o seu processo de reconhecimento, terá grandes chances de ter de voltar ao Brasil.

De falar em voltar ao Brasil, nas recentes manchetes em jornal mineiro de grande circulação, noticiaram que, por causa do mesmo problema, o Brexit, muitos brasileiros estão buscando o rumo de casa, entre eles, numerosos mineiros vindos de Governador Valadares (grande exportadora de mão de obra), Triângulo Mineiro e outras cercanias interioranas. Se havia perseguição àqueles que buscavam um lugar ao (fraco) sol nas terras de Sua Majestade, agora ela fechará ainda mais o cerco aos imigrantes que, mesmo com visto de turista, se arriscaram a permanecer incógnitos aceitando os empregos que os nativos desprezavam (mas agora vão querer de volta).  Há ainda aqueles que, mesmo sem sucesso, preferem continuar tentando por lá, como uma outra cliente minha, cujos documentos foram submetidos à minha tradução juramentada para que ela pudesse casar-se com um inglês. De fato, depois de muito stress para ser aceita pelas autoridades britânicas, casou-se com o rapaz, que acabou se revelando um mau-caráter, e, findo o casamento, continua a sua batalha diária para conseguir permanecer em solo europeu. Pelo menos o casamento serviu para isso: ela tem visto de permanência.

Pelo visto, aqueles imigrantes que ainda têm um fio de esperança de se estabelecerem em terras estrangeiras, estão tentando torna-las menos estrangeiras e conseguir seu intento.  Como tradutora pública, que lida oficialmente com a parte burocrática desses processos de aceitação, não posso deixar de me emocionar pelos “causos” que testemunhei e ainda vou testemunhar enquanto a crise brasileira persistir.  É, como dizia Guimarães Rosa, grande contador de causos, estórias e histórias dos nossos rincões:

“ O correr da vida embrulha tudo.
A vida é assim: esquenta e esfria,
aperta e daí afrouxa,
sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem.”